O
Ministério da Justiça lança a nova Campanha Nacional de Desarmamento
nesta sexta-feira (06), com a promessa de inutilizar as armas no ato da
entrega, acelerar a indenização e assegurar anonimato aos voluntários.
O
início da campanha foi antecipado em um mês em reação à tragédia de
Realengo, onde um atirador matou 12 crianças nas salas de aula de uma
escola municipal, há um mês. O atirador usou armas obtidas no mercado
ilegal, e o crime reacendeu o debate sobre o desarmamento e o controle
ao tráfico de armas no país.
Segundo
o grupo Viva Rio, cerca de 35 parentes das vítimas são esperados no
lançamento, às 10h, no Palácio da Cidade, para marcar sua adesão à
campanha. A solenidade contará com a presença do ministro da Justiça,
José Eduardo Cardozo, e do governador e prefeito do Rio. A campanha
envolve as instâncias federal, estadual e municipal.
"Nesta
campanha, as principais novidades são que o cidadão não precisa dar
nenhuma informação a seu respeito, e a arma receberá marretadas na sua
frente", diz Shelley de Botton, coordenadora de comunicação do Viva Rio,
uma das ONGs engajadas na campanha.
A
legislação brasileira determina que apenas o Exército pode destruir
armas, por isso o recurso ao "sistema da marretada" nos postos de
recolhimento (polícias, delegacias, igrejas e sedes de ONGs), para
inutilizá-las e dissipar dúvidas de que possam ser desviadas.
A
indenização não será mais depositada na conta dos voluntários, como da
última vez. "Elas receberão um voucher do Banco do Brasil e poderão
retirar o dinheiro no terminal de saque de qualquer agência no país",
diz Melina Rossi, diretora do Instituto Sou da Paz.
O
novo procedimento é uma reação a problemas ocorridos na última
campanha. A indenização varia de R$ 100 a R$ 300, de acordo com o modelo
da arma, e não se estenderá à entrega de munição, como chegou a ser
aventado.
Menos armas, menos crime
O
objetivo da campanha é tirar armas de circulação e reduzir a taxa de
homicídios no país. "Já temos vários estudos sérios mostrando que a
redução do número de armas em circulação tem efeito positivo sobre a
redução de homicídios", diz Risso.
A
atual campanha é a terceira realizada pelo Ministério da Justiça. Nas
duas anteriores (em 2003/2004 e 2008/2009) foram entregues,
respectivamente, 460 mil e 40 mil armas. No período, de acordo com o
Ministério da Saúde, o número de homicídios por armas de fogo caiu 11%
no país.
O
Viva Rio estima que haja cerca de 16 milhões de armas no país, das
quais pouco menos da metade (7,6 milhões) pertenceriam às forças de
segurança do governo, e quase metade estaria em situação ilegal.
"Acreditamos
que quanto menos armas estiverem circulando nas ruas e nas mãos de
civis, menos mortes teremos", afirma Botton, que começou a trabalhar no
Viva Rio em 2003 e entregou, na primeira campanha, uma arma que seu
marido havia recebido da família.
"A
sensação foi a de estar me livrando de uma coisa que só faz o mal,
porque a arma só tem uma função, que é matar", afirma. "Algumas pessoas
acreditam que uma arma pode trazer mais segurança, mas procuramos
mostrar que geralmente é o contrário."
'Impacto nulo'
Presidente
da ONG Movimento Viva Brasil, Bene Barbosa diz que a campanha "foi
organizada às pressas para dar uma resposta à sociedade após Realengo" e
que sua antecipação foi "oportunista". Ele afirma que promover o
desarmamento da população civil é uma maneira ineficiente de combater a
criminalidade.
"Quem
entrega as armas são aposentados, viúvas, gente que tem uma arma velha
em casa e não sabe o que fazer com ela", afirma. "Não são as armas que
circulam entre os criminosos, as que são vendidas ilegalmente. O impacto
sobre a criminalidade vai ser nulo."
Barbosa
diz que o governo não vai conseguir cumprir a garantia de anonimato a
quem entregar as armas. Para transportá-las aos postos de recolhimento
sem que se enquadrem no porte ilegal, as pessoas precisam preencher uma
Guia de Trânsito (GT) na Polícia Federal, que pede seus dados pessoais.
Risso
diz que, na campanha, as GTs dispensarão a identidade das pessoas.
Porém, no site da Polícia Federal, os primeiros campos a serem
preenchidos no formulário disponível de GT pedem para informar nome, RG e
CPF do portador.
João
Trajano Sento Sé, professor do departamento de Ciências Sociais da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), diz que países como
Austrália e Inglaterra tiveram exemplos bem-sucedidos de redução de
número de homicídios associado a campanhas de desarmamento.
No
Brasil, entretanto, ele aponta que o referendo de 2005 - quando a
população civil optou pelo direito de poder adquirir armas - ainda
conspira contra a capacidade de mobilização.
"Acho
que campanha não emplaca, porque a mobilização do plebiscito é muito
recente", afirma. Por outro lado, ele cobra as políticas de estado na
área de segurança prometidas em época de campanha pela presidente Dilma
Rousseff, ainda não levadas adiante.
Com BBC Brasil
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