“Faço jornalismo, não militância política”
Não
poderia deixar de abordar um belo momento do jornalismo brasileiro, a
prova definitiva de que não se pode discriminar profissionais que, até
por falta de opção, trabalham para o oligopólio pretensamente imperial e
antidemocrático que domina a comunicação no Brasil.
Na
terça-feira (20), por volta das 19 horas, foi ao ar o programa da
emissora a cabo Globo News, o “Em Pauta”, apresentado pelo jornalista
Sergio Aguiar, que entrevistou o jornalista Caco Barcelos e teve a
participação virtual da jornalista Eliane Cantanhêde.
O
começo da entrevista deixa bastante claro que Barcelos, um repórter
renomado e corajoso, não seria presa fácil para a manipulação de seus
empregadores. Reproduzo, a seguir, esse diálogo entre entrevistador e
entrevistado.
—
Sergio Aguiar — Vamos explorar esse seu lado repórter, primeiro: como é que estava a manifestação, lá?
Caco
Barcelos — Três mil pessoas me parecem uma forte manifestação
“virtual”; o Facebook fala mais de 30 mil pessoas. Na rua, na praça,
pouco. Por volta de três mil…
Aguiar — Foi mais “devagar” do que se esperava, então?
(…)
Barcelos
— É interessante, não é, o pessoal com vassoura? Eu lembro do tempo do
Jânio Quadros. O pessoal usava vassoura para “varrer os comunistas”,
queriam um regime militar… Não é?
Aguiar — A Vassoura volta, agora, a entrar na moda, será?
Barcelos — Talvez com outra conotação…
(…)
Barcelos — Interessante, também, que ninguém protesta contra os corruptores; só contra os corruptos… (sorriso)
Aguiar — Agora, você acha que essa mobilização menor do que o esperada [sic] é porque o brasileiro está um pouco descrente?
Barcelos — Não sei te dizer…
(…)
—–
A
Globo mutilou esse belo momento de coragem de um militante do bom
jornalismo, responsável, apartidário, e que, dali em diante, travaria
com Eliane Cantanhêde um diálogo que constitui um dos mais completos
diagnósticos da crise por que passa a grande imprensa brasileira.
No
site do programa “Em Pauta”, a Globo cortou o resto da entrevista,
quando Barcelos diz a Cantanhêde tudo o que tem sido dito pelos que
militam pela democratização da comunicação no Brasil. Falou sobre os
assassinatos de reputação, do “jornalismo declaratório”, que distribui
acusações que, posteriormente, não são comprovadas, o que faz com que
gente inocente pague.
.
.
Cantanhêde
ainda tentou argumentar que a denúncia da mídia contra o ex-ministro
Antonio Palocci, por exemplo, revelou-se “verdadeira” porque se
descobriu que ele tinha um apartamento de 6 milhões de reais e, apesar
disso, viveria em um apartamento alugado por uma imobiliária que tentou
caracterizar como suspeita, apesar de que tal denúncia jamais se
mostrou verdadeira.
Barcelos
disse a ela que discorda porque faz jornalismo e não “militância
política”. E reiterou que há vários exemplos de casos em que a mídia
acusou sem provas e as pessoas acusadas, depois, mostraram-se
inocentes.
A
censura que a Globo impôs a parte da entrevista insinua que Barcelos
pode ter problemas. Não será surpresa se, apesar de seu currículo
invejável, vier a se juntar outros que tiveram que deixar a Globo por
discordarem do patrão.
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